segunda-feira, 29 de junho de 2009
GAVETAS
Minhas gavetas andam - um tanto cheias;
Tenho ímpetos de arrumá-las em seu conteúdo.
Da composição gosto.
Penso, sem motivo que me importune,
Que há nelas coisas em demasia
Mas, sempre que tento, nada elimino.
São coisinhas minhas...
Bilhetes... Cartas, lembranças de gente de que gosto!
Badulaques pequenos
Restos inteiros de coisas que nem sei de onde vieram...
Coisas que esperam o hiato;
Coisas minhas que me socorrem esperam e exigem tato;
Coisas inúteis que me fazem falta e exigem atos.
Atroz e mudo - calo.
Minhas gavetas são minha vida...
Acho que não dá para arrumar sozinho,
Não sei eliminar o lixo!
Não reconheço joio ou trigo.
Nas gavetas - nunca...
Pio Muniz Falcão
domingo, 28 de junho de 2009
CANÇÃO MÍNIMA
CLAREIRA
Seria tão bom, como já foi,
As comadres se visitarem nos domingos.
Os compadres fiquem na sala, cordiosos,
Pitando e rapando a goela. Os meninos
Farejando e mijando com os cachorros.
Houve esta vida, ou inventei?
Eu gosto de metafísica, só pra depois
Pegar meu bastidor e bordar ponto de cruz,
Falar as falas certas: a de Lurdes casou,
A das Dores se forma, a vaca fez, aconteceu,
As santas missões vêm aí, vigiai e orai
Que a vida é breve.
Agora que o destino do mundo pende do meu palpite,
Quero um casal de compadres, molécula de sanidade,
Pra eu sobreviver.
Adélia Prado
Poema de Sombra
É urgente o amor
É urgente o amor.
É urgente um barco no mar.
É urgente destruir certas palavras,
ódio, solidão e crueldade,
alguns lamentos,
muitas espadas.
É urgente inventar alegria,
multiplicar os beijos, as searas,
é urgente descobrir rosas e rios
e manhãs claras.
Cai o silêncio nos ombros e a luz
impura, até doer.
É urgente o amor, é urgente
permanecer.
Eugénio de Andrade
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