Seguidores da Poesia

Uma pessoa deveria, pelo menos todos os dias, ouvir uma pequena canção, ler um bom poema, ver uma bela imagem e, se possível, dizer umas poucas palavras sensatas. (Goethe)

sábado, 26 de dezembro de 2009

Das coisas que eu gosto



Gosto dos dias chuvosos, nublados, eles me fazem sonhar.
Gosto da vida mais tímida, da vida com mais sortilégios.
Gosto quando o sol brilha depois de uma chuva. Dos pingos da chuva que brilham como gotas de cristal, nas folhas, nas flores e nas vidraças das janelas fechadas.
Gosto de fazer as coisas fora do óbvio. Gosto de usar minha criatividade fora de datas óbvias.
Não quero me limitar a viver apenas do que faz sentido.
Gosto de prazeres simples. De andar descalça, de arvoredos, de banhos de chuva, das águas dos rios, de canteiros floridos, de andar a toa, de chocolate, de ler poesias.
Gosto de namorar... um namorinho gostoso entre goles de vinho.
Gosto do amor alegre, mesmo o amor que não deu certo, do amor que termina.
Gosto da música, mágica e poderosa. Ela é o veículo mais delicado e sutil para a manifestação das nossas emoções.
Gosto do tempo, que não espera por ninguém.
Tempo para o amor, para os amigos, para o trabalho, para acertos e desacertos.
E saber que sempre haverá tempo para centenas de indecisões

Estela (Eu)

terça-feira, 10 de novembro de 2009

Enunciação encantatória



Flor-da-cachoeira, flor-d'água, flor-da-esperança
flor-da-imperatriz, flor-da-noite, flor-da-paixão
flor-da-páscoa, flor-da-quaresma, flor-da-redenção
flor-das-almas, flor-das-pedras, flor-da-verdade

flor-de-abril, flor-de-amor, flor-de-amores
flor-de-babado, flor-de-babeiro, flor-de-baile
flor-de-baunilha, flor-de-besouro, flor-de-caboclo
flor-de-cal, flor-de-cardeal, flor-de-carnaval

flor-de-cera, flor-de-chagas, flor-de-cobra
flor-de-couro, flor-de-contas, flor-de-coral
flor-de-duas-esporas, flor-de-gelo

flor-de-índio, flor-de-jesus
flor-de-lã, flor-de-lis, flor-de-madeira
flor-de-maio, flor-de-mico, flor-de-natal.

Flor-de-maio, flor-de-padre, flor-de-papagaio
flor-de-passarinho, flor-de-pau, flor-de-pérolas
flor-de-sangue, flor-de-são-joão, flor-de-são-miguel
flor-de-sapo, flor-de-seda, flor-de-sola

flor-de-trombeta, flor-de-vaca, flor-de-viúva
flor-do-campo, flor-do-céu, flor-do-espírito-santo
flor-do-imperador, flor-do-monturo, flor-do-natal
flor-do-norte, flor-dos-amores, flor-dos-formigueiros

flor-santa, flor-seráfica, flor-tigre, flor
flor, flor, flor, flor, flor, flor, flor, flor
flor, flor, flor, flor, flor, flor, flor, flor

flor, flor, flor, flor, flor, flor, flor, flor, flor
flor, flor, flor, flor, flor, flor, flor, flor
flor, flor, flor, flor, flor, flor, flores, flores.

Beija-flor de vôo muito veloz e que
se alimenta de néctar das flores
e de insetos minúsculos, colibri,
chupa-flor, pica-flor, chupa-mel,

cuitelo, guanambi, guinumbi, guainumbi,
beija-flor-d'água, bico-de-agulha,
beija-flor-da-mata, ariramba-da-mata-virgem,
beija-flor-do-mato, do S.O. do Brasil,

de dorso verde-dourado, penas marginadas
de amarelo, estria pardo-avermelhada acima
e por trás dos olhos, prolongando-se no pescoço,

mancha preta atrás dos olhos e o meio da garganta
e o abdome negros e orlados de branco
beija-flor-grande, bico-de-agulha, beija-flor-pardo.

Beija-flor vermelho do N. e L. da América do Sul
de cabeça, cauda e coberteiras inferiores da cauda
vermelhos, com brilho vivo, dorso verde-escuro,
garganta cor de cobre com tons dourados

e abdome escuro. A fêmea tem colorido
menos acentuado. Beija-flor-grande, beija-
flor-pardo, beija-flor, beija-flor, beija-flor
rhanphodon naevius, crysolampis elatus, beija-flor

por ser primavera e por seres pássaro e flor
eu te nomeio também embaixador e te prefiro
em meu ombro em meu dorso em meu canto,

mais do que todas as palavras escolhidas
o teu mel derramado sobre este livro
faça-o dourado e doce e livre e voador.

Coleira-de-sapé, coleira-do-brejo, dorso, retrizes
e coberteiras da cauda pardo-amareladas, cabeça, nuca
rêmiges e cauda negras, garganta branca com colar negro
separando-a do peito e fronte com duas manchinhas brancas

coleirinha do sul do País até
a margem direita do baixo Amazonas
coloração cinza, fronte e parte anterior
do vértice enegrecidos, orelhas pretas

faces brancas, garganta branca com
uma faixa preta no meio, abdome branco
com uma fita preta atravessando

o peito e flancos cinzentos, coleira
virada, coleiro-da-baía, coleiro-da-serra,
coleiro-do-sapé, coleiro-do-brejo, coleiro-pardinho.


Marigê Quirino Marchini

Foto: Beth Marques

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

O Vestido



No armário do meu quarto escondo de tempo e traça meu vestido estampado em fundo preto.
É de seda macia desenhada em campânulas vermelhas à ponta de longas hastes delicadas.
Eu o quis com paixão e o vesti como um rito, meu vestido de amante.
Ficou meu cheiro nele, meu sonho, meu corpo ido.
É só tocá-lo, volatiza-se a memória guardada:
eu estou no cinema e deixo que segurem minha mão.
De tempo e traça meu vestido me guarda


Adélia Prado

OBS.
Esta poesia com este vestido lindo foi publicada, originalmente no meu outro blog FACEIRICE, em maio de 2009. Mas ao escrever o nome da artista, errei por um pequeno detalhe, troquei uma letra: O nome correto é Andrea Stajan-Ferkul (com "l" e não "t", no Ferkul).
Portanto amigos, peço que, caso o queiram levar, façam essa correção, pois o nome da pessoa é muito importante.

terça-feira, 27 de outubro de 2009

Rabiscos de Andréa



Eu queria ser tronco, nada oco,
tronco de mato verde,
broto e semente.
Deixar cair as paranóias,
renascer brônquios... (de que jeito?)
Ser eu mesma o oxigênio.

Andréa Abdala

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Cartas de Amor


Todas as cartas de amor são
Ridículas.
Não seriam cartas de amor
Se não fossem
Ridículas.
Também escrevi em meu
Tempo cartas de amor,
Como as outras,
Ridículas.
As cartas de amor,
Se há amor,
Têm de ser
Ridículas.
Mas, afinal,
Só as criaturas que nunca
Escreveram
Cartas de amor
É que são
Ridículas...


Fernando Pessoa como Álvaro de Campos

sábado, 26 de setembro de 2009

ARBÓREO


Há uma arte
de olhar
pra árvores

Exige tempo
e silêncio
(dentro e fora)

Semeia
leveza


Fábio Rocha

REMEDINHO




Num dia gris
de cinema e chá mate
um rapaz elegante
olhos de chocolate
me entregou uma canção
uma rosa e um edredom...

Homens gentis
são bem mais eficazes
do que cebion.

Raiça Bomfim

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

É pura volúpia...



UM PRESENTE PARA CRISTINA SIQUEIRA
FELIZ ANIVERSÁRIO!

sábado, 29 de agosto de 2009

A alma do sonho


... a alma do sonho fez-se ouvido
Tão vertiginoso e profundo
Que capta o recado perdido
Dos ocultos donos do mundo...

Cecília Meireles

A Poesia


Prima irmã do vento
A poesia se infiltra
Em tudo, invisível.

Lena Jesus Ponte

Gorjeios



Gorjeio é mais bonito do que canto porque nele se
Inclui a sedução,
É quando a pássara está enamorada que ela gorjeia.
Ela se enfeita e bota novos meneios na voz.
Seria como perfumar-se a moça para ver o namorado.
É por isso que as árvores ficam loucas se estão gorjeadas.
É por isso que as árvores deliram.
Sob o efeito da sedução da pássara as árvores deliram.
E se orgulham de terem sido escolhidas para o concerto.
As flores dessas árvores depois nascerão mais perfumadas.

Manoel de Barros

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

O Cisne e a Bailarina



De aspecto gracioso,
Com penas brancas
Na água dança
Como a bailarina
De passos mágicos
A linda dançarina
Na água se lança..

Renata Cordeiro (para Estela)

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domingo, 16 de agosto de 2009

AVIS RARA


MAGRITTE - La Promesse


AVIS RARA

Imersos
Nos desvãos da incerteza,
Deixamos que o amor,
Sutil fragrância,
Impregne-nos
Os secretos recônditos,
Para, um dia,
Como sói a nós,
Humanos,
Perdê-lo,
Perdendo-nos
Em seu rastro.

O amor bem pode ser
Auto-de-Fé,
Suplício atroz,
Blasfêmia,
Mesmo infâmia.
Mas, também,
O roçar da seda pura,
Graça plena,
Vento forte,
Frêmito profano.

Louvado seja, pois,
A todo instante,
O bem supremo
De tê-lo plenamente,
Guiando nosso rumo
Entre as falésias,
Não permitindo
Que nos destruam as tempestades,
Freqüentes em tempos tão insanos.

Nilton Maia

Para ler mais poemas deste autor clique aqui

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

Com aquela sua maneira


Com aquela sua maneira de sol entrar em casa
E com o seu olhar furado de nascentes
O menino podia ver até a cor das vogais –
Como o poeta Rimbaud viu.
Contou que viu a tarde latejar de andorinhas.
E viu a garça pousada na solidão de uma pedra.
E viu outro lagarto que lambia o lado azul do
silêncio.
Depois o menino achou na beira do rio uma pedra
canora.
Ele gostava de atrelar palavras de rebanhos
diferentes
Só pra causar distúrbios no idioma.
Pedra canora causa!
E um passarinho que sonhava de ser ele também
causava.
Mas ele mesmo, o menino
Se ignorava como as pedras se ignoram.

Manoel de Barros

quarta-feira, 29 de julho de 2009

AUTO-RETRATO



Alguém diz que sou bondosa:
está tão enganado que dá pena.
Alguém diz que sou severa,
e acho graça.
Não sou áspera nem amena:
estou na vida como o jardineiro
se entrega em cada rosa:
corte, sangue, dor e aroma,
para que a beleza fique na memória
quando a flor passa.

(Amar é lidar com os espinhos
de quem ama por inteiro:
com força, não com fraqueza.)


Lya Luft

domingo, 26 de julho de 2009

quarta-feira, 22 de julho de 2009

O PROVEDOR




Andar à toa é coisa de ave.
Meu avô andava à toa.
Não prestava pra quase nunca.
Mas sabia o nome dos ventos
E todos os assobios para chamar passarinhos.
Certas pombas tomavam ele por telhado e passavam
as tardes freqüentando o seu ombro.
Falava coisas pouco sisudas que fora escolhido para
ser uma árvore.
Lírios o meditavam.
Meu avô era tomado por leso porque de manhã dava
bom-dia aos sapos, ao sol, às águas.
Só tinha receio de amanhecer normal.
Penso que ele era provedor de poesia como as aves
e os lírios do campo.

Manoel de Barros – do livro Ensaios Fotográficos
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sexta-feira, 17 de julho de 2009

terça-feira, 14 de julho de 2009

A canção da vida


A vida é louca
a vida é uma sarabanda
é um corrupio...
A vida múltipla dá-se as mãos como um bando
de raparigas em flor
e está cantando
em torno a ti:
Como eu sou bela
amor!
Entra em mim, como em uma tela
de Renoir
enquanto é primavera,
enquanto o mundo
não poluir
o azul do ar!
Não vás ficar
não vás ficar
aí...
como um salso chorando
na beira do rio...
(Como a vida é bela! como a vida é louca!)



Mario Quintana (Esconderijos do Tempo)


Para ler e saber mais de Quintana, clique no link na coluna lateral ou clique aqui.

sexta-feira, 10 de julho de 2009

SOU MULHER QUE ENCANTA



Sou mulher que encanta
Qual flor
Sacudida
Pelos ventos
Meus atrativos
Presentes em todos os tempos
Cintilam
Tenho cálices redondos e rosados
Formas curvilíneas
Cheiros açucarados
E sei fazer feitiços
Que entretecem
A vida
Dos homens e das flores



POEMA DE RENATA CORDEIRO

Baú



Minha mãe era miúda
mas recheava as frases
com palavras sumarentas e exibidas:
estupefata
escalafobético
détraqué
bordô e grená.
Hoje vasculho esses sons no ar
em busca de pompa
em busca de sombra.

Mariza Tavares

Imagem - Tânia Leal

Permutas poéticas




Troca-se um cheiro de fumaça
por um odor de terra molhada.

Uma nuvem de pernilongos por
uma nuvem branca, de vapores
condensados lembrando sorvete de limão.

Um gramado grande, ressequido
por um canteiro de Amarílis.

Um caixote de folhas secas por
um ramo de alecrim.

Meia dúzia de envelopes de sementes
de flores por um buquê de violetas.

Um céu sem nuvens por outro, carregado
de nuvens densas.

Uma estiagem por um temporal.

Uma chuva de fagulhas de canavial
por uma chuva criadeira.

Um cheiro de garapão por
um odor de murta.

Alguns sonhos desfeitos
por uma esperança.

segunda-feira, 6 de julho de 2009

ESPUMA DO MAR



Que assombro! Como a espuma do mar é bela!
Uma onda irrompe raivosa no rochedo, quebra-se toda
em violenta espumarada branca, sibilante,
e ricocheteia, recolhendo o fôlego, irada, frustrada –
que belo!

D. H Lawrence

sábado, 4 de julho de 2009

Oferenda Lírica



Quando era nova a criação, e as estrelas brilhavam com seu primeiro esplendor, os deuses reuniram-se no céu e cantaram: “Oh, imagem da perfeição, Oh alegria pura!”
– Mas de repente um deles exclamou: “Parece que se rompeu a corrente de luz em alguma parte!” – “Parece que se perdeu uma estrela!”
Partiu-se uma corda de ouro de alguma das harpas dos deuses. Silenciou o seu canto e lamentaram: “A estrela perdida era a mais bela, era a glória de todos os céus!”
O Mundo perdeu a sua única jóia.
Entretanto, no profundo silêncio da noite, as estrelas sorriem e murmuram: “Inútil a busca. A perfeição inteira está em toda parte!”

RABINDRANATH TAGORE – GITANJALI

sexta-feira, 3 de julho de 2009

AS FLORES E OS HOMENS



As flores atingem a sua “floridade” – é um milagre.
Os homens não atingem a sua humanidade – é uma pena.

Tudo que espero de vocês, homens e mulheres,
Tudo o que de vocês espero
É que alcancem a sua própria beleza, tal como as flores.

Ah! Parem de dizer que eu os quero selvagens.
Digam-me, a genciana é selvagem no tope de sua rústica haste?
Oh! Onde, em vocês, a resposta a esse azul?

D. H Lawrence

segunda-feira, 29 de junho de 2009

Poesia



LEVE ESTE CARTÃO COM VOCÊ.

GAVETAS



Minhas gavetas andam - um tanto cheias;
Tenho ímpetos de arrumá-las em seu conteúdo.
Da composição gosto.
Penso, sem motivo que me importune,
Que há nelas coisas em demasia
Mas, sempre que tento, nada elimino.
São coisinhas minhas...
Bilhetes... Cartas, lembranças de gente de que gosto!
Badulaques pequenos
Restos inteiros de coisas que nem sei de onde vieram...
Coisas que esperam o hiato;
Coisas minhas que me socorrem esperam e exigem tato;
Coisas inúteis que me fazem falta e exigem atos.
Atroz e mudo - calo.
Minhas gavetas são minha vida...
Acho que não dá para arrumar sozinho,
Não sei eliminar o lixo!
Não reconheço joio ou trigo.
Nas gavetas - nunca...


Pio Muniz Falcão

domingo, 28 de junho de 2009

CANÇÃO MÍNIMA


No mistério do Sem-Fim,
equilibra-se um planeta.
E, no planeta, um jardim,
e, no jardim, um canteiro;
no canteiro, uma violeta,
e, sobre ela, o dia inteiro,
entre o planeta e o Sem-Fim,
a asa de uma borboleta.

Cecília Meireles

CLAREIRA


Seria tão bom, como já foi,
As comadres se visitarem nos domingos.
Os compadres fiquem na sala, cordiosos,
Pitando e rapando a goela. Os meninos
Farejando e mijando com os cachorros.
Houve esta vida, ou inventei?
Eu gosto de metafísica, só pra depois
Pegar meu bastidor e bordar ponto de cruz,
Falar as falas certas: a de Lurdes casou,
A das Dores se forma, a vaca fez, aconteceu,
As santas missões vêm aí, vigiai e orai
Que a vida é breve.
Agora que o destino do mundo pende do meu palpite,
Quero um casal de compadres, molécula de sanidade,
Pra eu sobreviver.

Adélia Prado

Poema de Sombra


Se perdem gestos, cartas de amor, malas, parentes
Se perdem vozes, cidades, países, amigos
Romances perdidos, objetos perdidos, histórias se perdem.

Se perde o que fomos e o que queríamos ser.
Se perde o momento, mas não existe perda, existe movimento.

Bruna Lombardi

É urgente o amor


É urgente o amor.
É urgente um barco no mar.
É urgente destruir certas palavras,
ódio, solidão e crueldade,
alguns lamentos,
muitas espadas.
É urgente inventar alegria,
multiplicar os beijos, as searas,
é urgente descobrir rosas e rios
e manhãs claras.
Cai o silêncio nos ombros e a luz
impura, até doer.
É urgente o amor, é urgente
permanecer.

Eugénio de Andrade